Lua Nova de Libra – Quando As Almas Se Encontram
– … Mas, se querem ouvir-me calados, posso contar-lhes um caso de minha vida, em que ressalta a mais clara demonstração acerca da matéria de que se trata. Em primeiro lugar, não há uma só alma, há duas…
– Duas?
– Nada menos de duas almas. Cada criatura humana traz duas almas consigo: uma que olha de dentro para fora, outra que olha de fora para dentro… Espantem-se à vontade, podem ficar de boca aberta, dar de ombros, tudo; não admito réplica. (…) A alma exterior pode ser um espírito, um fluido, um homem, muitos homens, um objeto, uma operação. Há casos, por exemplo, em que um simples botão de camisa é a alma exterior de uma pessoa; – e assim também a polca, o voltarete, um livro, uma máquina, um par de botas, uma cavatina, um tambor, etc. Está claro que o ofício dessa segunda alma é transmitir a vida, como a primeira; as duas completam o homem, que é, metafisicamente falando, uma laranja. Quem perde uma das metades, perde naturalmente metade da existência; e casos há, não raros, em que a perda da alma exterior implica a da existência inteira.
Este trecho retirado do conto “O Espelho” de Machado de Assis é também um pequeno retrato do que passaremos no próximo ciclo Lunar em Libra.
Libra, signo que marca em nossa jornada o encontro com o outro, regido por Vênus, Deusa do amor, prazer e harmonia, representado por uma balança, objeto que remete ao equilíbrio, marca o equinócio (primavera no hemisfério sul e outono no hemisfério norte), em que há proximidade de duração do dia e noite, e ainda ilustrado em um símbolo que carrega vários significados, dentre eles um círculo (espírito) incompleto ou o Sol se pondo no horizonte, remetendo em nossos Mapas ao Descendente, casa natural de Libra, e também o mergulho ao inconsciente, à sombra.
Em “O Espelho” o narrador relata um fato de seu passado, em que acabara de ser nomeado alferes (um posto militar) da Guarda Nacional e passou assim a ser reconhecido e reconhecido pelos com quem convive, dado o orgulho dos familiares da posição adquirida por ele. Em um dado momento, por um mês, ele visita a tia em um sítio distante e isolado, na companhia do cunhado e alguns escravos e passa a ser conhecido como “senhor alferes”. De tanto que lhe chamam desta forma se acostuma e esta se torna sua identidade. Mas, devido a uma doença na família, a tia precisou se ausentar com o cunhado, deixando o jovem aos cuidados da casa e dos escravos. Certa noite os escravos acabaram fugindo e o jovem se vê sozinho naquele casarão, distante de tudo e de todos. A solidão bate forte e ele passa a viver o terror naquela casa apenas consigo mesmo. Havia na sala um grande espelho, que ele relata como sendo o objeto mais bonito na casa. Um dia, ao se olhar no espelho, não se reconhece e chega a beira da loucura. Estava pronto para ir embora daquele lugar, até que veste a farda de alferes e se olha no espelho novamente antes de partir. Então, passa a reconhecer sua imagem, resgata sua identidade.
Este conto (aqui resumido) traz inúmeras discussões da nossa relação com os outros e como isso afeta a maneira como nos vemos, a pessoa que nos tornamos, e de que forma isso condiz com nossos desejos inconscientes, da alma interior. O outro pode nos atribuir inúmeras características, mas só nos identificamos com aquilo que reconhecemos, com que ressoa em nossa alma. Assim, nos vemos refletidos no outro e quando ele se ausenta, nosso reflexo vai embora, uma parte de nós vai embora, mas na verdade não é o outro a metade da laranja. Somos a laranja por completo, mas atribuímos uma de suas metades ao outro.
O signo de Libra vem para apontar essas duas metades, coloca o espelho diante de nós a partir do momento em que nos relacionamos com alguém. Então descobrimos características nossas, algumas boas e outras repulsivas. O outro também vive a mesma condição. Assim, na ausência de um, o outro fica incapaz de manifestar o melhor (e também o pior) que há nele. A solidão, portanto, não é uma opção, resta então indivíduos distintos encontrarem o equilíbrio entre suas almas. Voltamos à representação da balança pelo signo de Libra, cujo elemento ar indica a racionalização da alma, promovida através da interação entre dois indivíduos, que, para não se verem sozinhos com suas almas, buscam compreensão e harmonia.
Este ciclo libriano que se inicia faz com que as relações tomem um grau maior de importância. Talvez maior do que estamos acostumados, uma vez que a Lua Nova vem acompanhada por Júpiter. É fato que não podemos seguir nossa jornada desacompanhados, apesar da solidão fazer parte de nossa história. Nascemos e morreremos sozinhos, singulares, ninguém escapa disso. Mas a alma precisa se expandir através do outro. Refletimos no outro tudo que é consciente e inconsciente, tudo que vemos e tudo que ainda temos que ver e aprender sobre nós mesmos. Só assim poderemos nos reconhecer como laranjas inteiras.
Há também nesta Lua Nova um sextil de Saturno em Sagitário. Não somente devemos nos expandir através do outro neste momento como também fortalecer esses laços, estruturar o presente para construir positivamente um futuro. Vênus, regente de Libra e dispositor dessa lunação, encontra-se no signo de Escorpião, e recebe um trígono de Netuno. Sabemos que Vênus está exilada em Escorpião e a manifestação do amor e do afeto vem com muito controle e medo, características contrárias ao que é o amor. Mas Vênus em Escorpião nos ensina o sentimento de perda, leva o amor ao nível mais profundo, nos coloca em contato com o lado inconsciente da mente e sombrio de nossas almas. E assim nos transformamos, passamos a enxergar nossa laranja mais completa uma vez que se entende que o outro não é responsável pela nossa metade. Felizmente, este trígono a Netuno eleva a relação a uma qualidade altruísta e compassiva. Uma relação transformadora não precisa ser dolorida, é também aquela relação que nos inspira, que nos coloca em contato com o lado mais espiritual e divino.
A Lua Nova marca o início dessa transformação positiva, dessa expansão e estruturação através das relações. Seu ápice é marcado pela Lua Cheia em Áries, acompanhada por uma conjunção a Urano e recebendo oposição de Mercúrio.
Note aqui o sentimento muito forte de individualização. O quanto nos anulamos pelo outro? O quanto a balança da relação pesa mais para um lado? Marte, o dispositor desta Lua, encontra-se exaltado em Capricórnio e conjunto a Plutão. Faz ainda uma quadratura a Mercúrio e Júpiter, estes em Libra. Os aspectos tensos em signos cardinais indicam a volatilidade presentes em qualquer relacionamento.
Lembrando que Júpiter, também em aspecto na Lua Nova, pode expandir qualquer condição que se encontra a relação. Se ela for boa, há oportunidade para ficar melhor; se estiver ruim, então é provável que o desgaste gere ruptura, marcada pela Lua Cheia com Urano. O sentido construtivo das relações é fortalecido pelo dispositor da Lua Cheia em Capricórnio. Sua conjunção a Plutão também reforça o caráter controlador, obsessivo, destruidor e transformador que muitas vezes passamos com o outro. Não é fácil encararmos nossa alma, mas mais difícil ainda é sua aceitação, através da metade inconsciente que o outro expõe. Podemos negar ou negligenciar, acreditar no que queremos e ainda arrumar desculpas (quadratura Mercúrio e Júpiter), mas somente quando encaramos a condição como ela é temos como assumir o poder que aquilo nos traz e utilizá-lo em outros setores de nossas vidas (Plutão e Marte em Capricórnio), definindo melhor quem somos, firmando nossa individualidade, e refletindo tal condições nos relacionamentos presentes e futuros. Felizmente, este Marte dispositor recebe um sextil de Netuno. Sempre podemos contar com nossa intuição e o lado mais sensitivo para nos guiar. Quando há intimidade, somos capazes de sentir que algo na relação não vai bem. Cabe a nós a escolha de transformar ou não tal questão.
Por fim, podemos encerrar este ciclo refletindo outro pensamento. “O amor só é lindo quando encontramos alguém que nos transforme no melhor que podemos ser”. Vulgo dizer que o amor é lindo independente da situação e que qualquer coisa que seja feia, não é amor. Mas concordo que o amor fica mais lindo, quando nos é consciente esse caráter transformador. Que assim caminhem as relações neste novo ciclo.