Sobre a aplicação de Estatística em Astrologia: alguns comentários

14 de outubro de 2010 Arquivo, Pesquisa Comentários desativados em Sobre a aplicação de Estatística em Astrologia: alguns comentários

por Rodrigo Araês

Em março deste ano resolvi, por interesse profissional (sou professor da disciplina “Probabilidade, Estatística e Processos Estocásticos”), assistir uma aula de Estatística do prof. dr. Júlio César Rodrigues Pereira no curso de pós-graduação em cardiologia do IDPC- Instituto. Dante Pazzanese de Cardiologia. Aula muito interessante, clara e objetiva. Dr. Júlio nos contou a seguinte história:

“- Fui procurado por um médico da Santa Casa que iria defender tese de doutorado em Medicina. O motivo de sua procura foi que, por insistência do orientador, ele deveria dar um tratamento estatístico aos seus dados para torná-los mais científicos. Perguntei qual era a casuística, tempo de pesquisa e a que conclusões ele já tinha chegado. Disse que pesquisava o assunto há mais de dez anos, tinha centenas de casos e com tratamentos bem-sucedidos, pois aliava a pesquisa à prática médica. Era conhecido, no Brasil, como um dos maiores especialistas no assunto. Perguntei a ele, em seguida: `Doutor, e se a estatística mostrar que o senhor está errado?´ Sua resposta foi clara: `Doutor Júlio (os médicos e advogados sempre se tratam de doutor), isso é impossível, e, mesmo que fosse possível, nada neste mundo irá mudar o que penso depois de tantos anos de pesquisa e resultados positivos na área´. Respondi: `Doutor, não perca seu tempo com estatística (e acho que nem o dele), neste caso ela não vai provar nada. Confie mais no seu trabalho e diga ao seu orientador que o que ele está querendo é uma perda de tempo´.”

Toda a platéia riu. Dr. Júlio completou: “Não queiram tirar da estatística o que ela não pode dar. Quando o assunto se refere a seres humanos é necessário tomar muito cuidado. Vejo aplicações de estatística em trabalhos médicos que não têm sentido”.

No meu primeiro dia de aula deste ano, lancei uma moeda para cima e perguntei aos meus alunos qual era a probabilidade de dar cara ou coroa. Os que responderam falaram que era de 50%. Retruquei: “Como é que vocês sabem?”

Temos quatro formas básicas de encarar as probabilidades, teoria que é base da estatística: 1. o método clássico (foi o fundamento da resposta deles, baseados em Pascal, Fermat, Laplace e outros); 2. o método freqüencialista (von Mises) – jogo a moeda infinitas vezes e vejo a convergência; 3. o método axiomático de Kolmogorov – hoje considerado o ideal; 4. o método intuitivo, método que chamo de “achismo”, utilizado com sucesso em sistemas especialistas – leva em conta a heurística dos especialistas.

É muito fácil, para um manipulador, escolher dentro destes métodos um enfoque que leve a resposta para onde ele quiser.

O que tenho observado ao longo destes anos dando suporte a pesquisa na área médica é que é muito fácil manipular os dados – e sei por verificação própria e por leitura que os cientistas não são tão confiáveis, pois são tão humanos quanto nós. Já no início dos anos 70, houve um simpósio na Unesco sobre a responsabilidade social dos cientistas, colocando o dedo na ferida das pesquisas irresponsáveis. O livro lançado com os anais do congresso é preocupante. Durante décadas, pesquisas estatísticas, muitas bem elaboradas e fundamentadas, comprovaram que o cigarro não ocasionava danos aos seres humanos (sem comentários!). Sabemos dos desastres do “desfolhante laranja” no Vietnã, pesquisa patrocinada pelo exército americano, e dos múltiplos desastres provocados pela indústria farmacêutica. No ano passado fui indagado por uma jornalista da revista “Bons Fluidos” sobre os efeitos da irradiação dos celulares nos seres humanos. Entrei em diversos sites para saber das últimas pesquisas – elas invariavelmente diziam que os celulares não faziam mal algum. Ora, fui professor durante 30 anos de eletromagnetismo, e tenho mestrado em engenharia biomédica; fica difícil engolir essa notícia sabendo que quem tem marca-passo não deve usar celular, e que mesmo em pessoas sãs ele altera o eletrocardiograma.

Como membro de um comitê de ética em pesquisa na área da saúde, tive conhecimento de práticas em pesquisas mundiais de arrepiar os cabelos de carecas. Devido a isso acho muito difícil alguém aceitar uma pesquisa estatística astrológica feita por pessoas da área. O astrofísico português João Magueijo relata em seu livro “Mais rápido que a velocidade da luz” a dificuldade de publicar suas conclusões em revistas conceituadas, porque ele contrariava a teoria da relatividade de Einstein. Seu livro relata inclusive uma crítica mordaz de Einstein a um astrofísico russo que comprovou, a partir das próprias equações de Einstein, que o universo era expansivo, e não constante, como pressupunha Einstein. Depois ele se desculpou, tinha cometido um erro de álgebra. O meio científico é um meio igual a qualquer outro. Político, burocrático, detrator, invejoso e maledicente. Existem maravilhosas exceções, como em qualquer meio, mas não é fácil mudar os paradigmas existentes.

O que escrevi acima se deveu a um pedido de ajuda, feito pela doutora Elenir, na lista de debates da CNA, para uma pesquisa sobre astrologia empresarial. Escrevi, na época, para Dra. Elenir:

“Sou professor de estatística e temo pelo tamanho do trabalho e da amostra, daquilo que você pretende. Gauquellin utilizou 35 mil mapas em seu estudo, se não me falha a memória, e ele era estatístico prático de carteirinha. Não me interessa essa trabalheira. Depois de levantar e analisar por volta de 3 mil mapas nesta vida, confesso que estou mais do que satisfeito com os resultados das minhas leituras. Por outro lado, você quer provar que a astrologia é uma ciência exata e, como já escrevi antes, estou convencido de que ela não é. Faltam-me conhecimentos e argumentos científicos para provar que a astrologia é uma ciência, no sentido moderno do termo. Mas, como disse Confúcio, “um sábio não tem idéias”, ou seja, não se fixa a idéia alguma.

Mas vá em frente. Se você conseguir provar, ganhará a minha profunda admiração. Aplaudirei de pé. Os modelos antigos, paradigmas, segundo Kuhn, estão aí para serem derrubados. Às vezes é necessário que a velha geração, como eu, morra, para que sejam feitas mudanças. A programação linear foi descoberta por um aluno que não sabia que um determinado problema era considerado sem solução.

Desejo muito boa sorte. Você é uma mulher de muita coragem e determinação. Gostei da sua postura!”

Posteriormente a dra. Elenir, escreveu o seguinte, na lista de debates da CNA:

“Mas acho que podemos evoluir ainda mais… agora, entrando numa área que sempre relegou os estudos superiores a um plano de subalternidade, quase de ridicularização”.

Não posso aceitar este tipo de postura. Existem astrólogos matemáticos, astrofísicos, engenheiros, filósofos, médicos, advogados, etc. Astrólogos que não fariam feio aos antigos astrólogos como Morin, Regiomantono, Kepler e Newton . E estou falando só do Brasil. Pessoas do mais alto grau de cultura e sabedoria, mas, como em todas as áreas, compartilhando a astrologia com ignorantes e despreparados. Como diziam antigamente: “Quem burro nasce, togado ou não, burro morre!” Também não creio que, como já fizeram Choisnard e Gauquellin, uma pesquisa vá mudar a aceitação da astrologia no meio “científico”, o dono da verdade. Se duvidar, leia Paul Feyerabend que, em seu livro “Diálogo sobre o método”, comenta sobre um abaixo-assinado contra a astrologia que possuía a assinatura de uma plêiade de prêmios Nobel, que evidentemente não conhecia nada sobre o assunto. Como Feyerabend escreve: “Imagine que são iletrados desta espécie que decidem o que se deve e o que não se deve ensinar nas nossas escolas; iletrados de tal espécie proclamam com arrogante desprezo que as velhas tradições, nunca estudadas nem compreendidas, devem ser erradicadas, independentemente da importância de que se revestem para todos aqueles que querem viver segundo seus cânones”. O mesmo Feyerabend diz: “Temos que separar a Ciência do Estado, tal como foi feito com a religião”. (Meu Deus! E os fundamentalistas? Irão aceitar a astrologia?).

A astrologia tem, de uma história conhecida no Ocidente, mais de 5 mil anos. Qual outra forma de conhecimento permaneceu por tanto tempo? Como me informou um ex-adido cultural francês doutorando em escrita cuneiforme, numa conversa aqui em São Paulo : “O que os sumérios escreviam como suposição astrológica os hititas informavam como certeza”.

Qual conhecimento tem 2500 anos de registro de dados e confirmação de eventos? Essa forma mesquinha de se analisar o conhecimento a partir de medidas – só se conhece o que pode ser medido – é recente e duvido que perdure por mais cinqüenta anos. Os movimentos de criação dos modelos de estudos interdisciplinares e transdisciplinares, além da moderna visão da complexidade de Morin (Edgar Morin) dão sustentabilidade ao que digo.

Como disse antes para a dra. Elenir, e falo agora para todos: Façam pesquisa, mas não contem com a aceitação pelo atual establishment.

Parodiando Tom Cathcart e Daniel Klein, no preâmbulo do livro “Platão e um ornitorrinco entram num bar…*”:

Estes são meus princípios, se não gostarem tenho outros.

* e o barman olha para Platão com um olhar esquisito. “O que posso fazer?” – retruca Platão, “dentro da caverna ela era muito mais engraçadinha”.

Rodrigo Araês é astrólogo especialista em Astrologia Esotérica e membro do Conselho Deliberativo da CNA.

Sobre o Autor

CNA (Central Nacional de Astrologia)
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